quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Querido Diário

Algo bastante significativo aconteceu na minha vida há uns dias. À primeira vista simplório e singelo, bobo até, mas que realmente importou para mim: escrevi a última página do meu diário.

Tenho-o comigo desde os dez anos, o que torna o fato mais simbólico ainda: na virada para os 2.0, este decênio traduzido em letras feias rabiscadas nas folhinhas decoradas por potes de mel e simpáticos ursinhos Pooh com seus inflados abdomens representa metade da minha vida, e termina justamente quando me inicio em outra década.

Sei que muitos associam o hábito a garotinhas meio acéfalas que suspiram por um menino qualquer do colégio e sacramentam suas paixões com corações flechados preenchidos com seus nomes e os dos objetos de afeto. Eu, porém, refuto totalmente essa ideia — muito distorcida. Sempre achei diário uma maneira fantástica de resgatar o passado, rememorar os acontecimentos, o que passava pela sua cabeça, seus medos, inseguranças, a sensação de importantes experiências. Um pedacinho do que se foi e não deve se perder com o tempo. Digo até mais: uma catarse.

A primeira página foi escrita em 27/11/01, e trata de temas frivolérrimos: o primeiro dia de férias, comprimento do meu cabelo e a expectativa de ter minhas amigas na mesma sala que eu no próximo ano. “Espero que a 5ª série seja legal!” Ginásio, uhul, hein ?

Que nada.

Conforme o tempo foi passando, meus depoimentos foram ficando cada vez mais... melancólicos. Lá pelos 11, 12 anos, desenvolvi um complexo de inferioridade e passei a viver sonhando e apostando todas as fichas num futuro maravilhoso importado diretamente de filmes americanos — cheio de summer nights e com capacidade para se tornar the time of my life (agora vejo como as doses cavalares de enlatados afetaram minha visão de mundo — but I like it).

Coisas absurdas também povoam esses pequenos extratos de fibra de celulose. Fiz algumas letras de música (sem comentários), coloquei frases tipicamente extraídas de livros de autoajuda e, não riam, por favor, passei minhas lágrimas no papel e coloquei uma seta indicando “Minha lágrima”. Bizarro é pouco.

Era ensimesmada, sofria à Maria do Bairro e achava que tudo dava errado pra mim. Aos 16, 17 anos, fiquei mais calma. Conquistei coisas importantes e deixei de me achar a última pessoa do mundo — talvez a penúltima ou antepenúltima, mas já estava bom assim. Ao entrar na faculdade, me decepcionei um pouco com a vida de universitária (mais uma vez sumariamente enganada pelos filmes americanos) e com o curso. Achava tudo uma chatice, marasmo sem fim. Já em 2010 foi diferente. Só escrevi cinco vezes, mas posso afirmar que o saldo foi positivo... fato inédito!

Terminei o diário no dia 1/1/11, o que não dá exatamente dez anos mas enfim-enfim. Fiz uma retrospectiva sobre os anos que se passaram, em especial o último.

Agora, estou a postos para começar meu novo diário, e espero que quando fizer 30 anos essas folhinhas despretensiosas também me façam rir e chorar, lembrando do que me levou a ser quem eu sou.


*Agora, petiscos do meu meigo caderninho, com comentários à luz da, caham, maturidade.

“Ontem recebi minha nota em Matemática: valia 7 e eu tirei 5. Tô pra morrer” 15/05/2002 Nerd demais. Lembro que inclusive chorei nesse dia... e isso tudo por causa do correspondente a um inocente 71%. Ah se eu sequer vislumbrasse as tranqueiras que ainda estavam por vir no ensino médio, hein?

“Hoje foi aniversário da Fulana, e no jogo de ‘Verdade ou Conseqüência’ perguntaram se eu gosto do Ciclano. Claro que não! Que coisa imbecil!” 01/05/2003 Eu gostava do Ciclano. Aliás, ele é o loirinho bebê Johnson protagonista do post “Sobre boladas e desilusões amorosas”, que publiquei há um certo tempo. Mas não admitia nem sob tortura, nem mesmo pro meu diário — tinha paranoia de alguém ler.

“Não sei o que há de errado comigo. As pessoas continuam me achando uma cdf idiota” 27/08/2003 Fazer o que, eu era.

“Cá estou eu com 15 anos, a idade que sempre sonhei. Namorado, vários amigos, saídas... 0% do meu ideal foi realizado” 18/04/2006 Típica insatisfação... mas devo reconhecer que meus 15 anos foram chatinhos mesmo.

“2009 bem aí e eu vazo dessa merda de cidade” 23/06/06 Esse foi o auge do meu sonho de fazer faculdade fora. Até cheguei perto, quando larguei tudo ano passado pra tentar uma vaga na USP. Mas acabei repensando e permanecendo.

“Passei no vestibular! Quem diria, hein? Não esperava nunca!” 29/03/2008 Uma das fases mais legais da minha vida.

“Ando meio desanimada com o curso, ainda não me encontrei” 20/03/2009 Ô angústia...

“Tomei uma decisão drástica: largar direito e tentar jornalismo fora! Tá difícil convencer o pessoal aqui a me deixar ir, mas vou fazer de tudo!” 05/01/2010 Tudo = Inúmeros escândalos.


_______________________


acho que voltei.

4 comentários:

Ana Áurea disse...

eu adoro diários, tenho me forçado a escrever mais sobre meus dias para comparar a minha personalidade com a do ano que se passou hahahah, ver o que eu mudei e tal HAHAHA, passatempo de quem não tem o que fazer né amg?minha vó escrevia em um diário, eu ainda não tive a oportunidade de ler ele, mas eu imagino que deve ser super emocionante, até porque quando ela morreu eu era uma criancinha de 3 anos recém completos e não tive muito tempo pra conhecê-la e de algum jeito ela ainda vive nessas páginas né?eu acho que a gente vive nessas páginas tambem.

(AMEEEEEEEEEEI os trechinhos hahahaha)

Unknown disse...

Adorei o post! Tive um diário na 6a série, mas daí larguei de mão... Mas agora até que deu vontade de ter um tb! hehehe Bjs, Carol.

Maria Fernanda disse...

Nos poucos diários que tive eu fazia códigos secretos(cada letra era um desenho), pra ninguem saber o que eu escrevi. Mas nunca guardei nenhum, ou entao eles foram simplesmente se perdendo no meio de tantas mudanças.
Mas minha memória é muito, muito boa. Lembro de tudo que escrevi neles e do que estava acontecendo na época. Ás vezes ainda choro de saudades do meu passado, sabia? Acho que ter os diários guardados seria pior ainda ...
Adorei os trechos que você colocou! E essa coisa de não demonstrar os sentimentos pro PRÓPRIO DIÁRIO é tão Teresa! hahahahahaha

Cáh disse...

sempre escrevi aleatoriamente no meu diário... tenho muitas colagens! adorava colar coisas, besteiras e cartas nele! nunca tive muita paciência pra escrever meus dramas adolescentes... acho que se eu tivesse começado a escrever eu ia ter uns 4 diários de conflitos de jovens.. (falou a velha XD. Hoje minhas cartas novas são guardadas em caixas.. e o meu diário está amarrado! vou fazer um balanço! curti a idéeia! parabéns pela evolução, amiga! beijos